sexta-feira, março 31, 2006

A homofobia internalizada e os comportamentos para a saúde numa amostra de homens homossexuais


INTRODUÇÃO

O conceito de Homofobia Internalizada tem sido apresentado por muitos autores como um factor central na manifestação de vários aspectos relacionados com a saúde e com a doença entre pessoas homossexuais.
Definido como medo à própria homossexualidade, a homofobia internalizada é um fenómeno cultural, que não é universal, nem toma as mesmas formas ou o mesmo significado em diferentes grupos sociais.
O objectivo do presente trabalho é investigar como é que a existência de homofobia internalizada condiciona a adopção de comportamentos para a saúde, comparativamente entre sujeitos homossexuais com maiores e menores níveis de homofobia internalizada.
Para investigar esta questão, delineou-se um estudo comparativo entre dois grupos (um de homens homossexuais com maiores níveis de homofobia internalizada e outro com homens homossexuais com menores níveis de homofobia internalizada), prefazendo um total de 304 indivíduos da cidade de Lisboa.
Muito antes de perceberem a natureza da sua orientação sexual, os homossexuais internalizam uma série de mensagens correspondentes aos valores negativos face à homossexualidade. Muitas vezes, reconhecem os seus sentimentos de atracção por pessoas do seu próprio sexo e iniciam um processo psicológico de auto-rotulação que não é acompanhado por nenhuma abertura interpessoal das suas próprias emoções e comportamentos. Mas, iniciado o processo de autorotulação, os efeitos de dano psicológico ocasionados pelas tais mensagens negativas tomam lugar.
Meyer e Dean (1998) definem Homofobia Internalizada como «o direccionamento das atitudes sociais negativas para o self da pessoa gay, levando à desvalorização desse self e resultantes conflitos internos e uma auto-imagem empobrecida».
Os gays, as lésbicas e os bissexuais representam uma minoria sexual. Como tal, enfrentam tanta discriminação, estigmatização e violência que é apenas natural que, como resultado, lhes ocorram elevados níveis de stress e ansiedade. Tanto mais é assim que a nossa sociedade heterossexista apenas os tolera se não se assumirem e permanecerem para sempre ‘no armário’ (DiPlacido,1998). No entanto, ao contrário das outras minorias sociais, em muitos países (incluindo Portugal) aos homossexuais falta-lhes um reconhecimento constitucional que os proteja da discriminação.
Recentemente, alguns autores têm vindo a salientar a importância do factor do stress das minorias como sendo a componente principal da internalização da homofobia.
A manifestação mais comum da internalização da estigmatização é a sensação de vergonha face à perspectiva de ser identificado como gay(Mondimore, 1998). Esta sensação de vergonha pode ser o resultado do confronto com possíveis ameaças externas e internas e o bem-estar emocional do indivíduo vai depender da maneira como
ele as gere.
Apesar da crença de que os estados emocionais e de atitude influenciam os processos fisiológicos do corpo existirem há muitos séculos, só recentemente é que se obtiveram dados empíricos para o provar. Os estudos de Alameda County tornaram-se clássicos na investigação dos factores que levam as pessoas a atingir, manter e
promover a sua saúde. Estes comportamentos eram os seguintes (Matarazzo, & Leckliter, 1988):

1. Sete ou oito horas de sono por dia;
2. Tomar o pequeno-almoço quase todos os dias;
3. Nunca comer (ou raramente) entre as refeições;
4. Peso ajustado à altura;
5. Nunca fumar cigarros;
6. Consumo moderado (ou nenhum) de álcool;
7. Actividade física regular.

Desde há muito que os investigadores notaram que os comportamentos para a saúde diferem significativamente na sua complexidade entre grupos sociais. Determinantes sociais e demográficos, como o estatuto socio-económico ou o género sexual, devem ser tidos em conta. A par com o apoio social que o indivíduo tenha, talvez o determinante mais importante seja o simples acesso regular a um médico. Outros determinantes têm a ver com a percepção dos sintomas, as cognições e as emoções de uma pessoa.
Parece haver muitos indícios de que a existência de Homofobia Internalizada entre os gays compromete algumas dimensões da saúde física e mental dos indivíduos.
Assim, pareceu-nos fundamental explorar em que sentido isso acontece numa amostra de homossexuais da cidade de Lisboa, tentando perceber que factores ou dimensões estavam em jogo.
Pretendeu-se, então, com este trabalho, responder à seguinte questão de investigação: Será que existem diferenças significativas entre homossexuais com mais Homofobia Internalizada e homossexuais com menos Homofobia Internalizada no que diz respeito à adopção de comportamentos para a saúde? Se sim, de que maneira é que essa diferença se manifesta? Importava também saber se existiam diferenças significativas na adopção de comportamentos para a saúde quando a Homofobia Internalizada estava apenas condicionada por factores internos versus factores externos ou factores globais.


um trabalho da autoria de:
HENRIQUE PEREIRA (Psicólogo e docente na Universidade da Beira Interior)
ISABEL LEAL (Psicóloga e docente no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa)

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